Estágio atual e perspectivas da caprinovinocultura na Região Nordeste







Estágio atual e perspectivas da caprinovinocultura na Região Nordeste






(*) José Romero Araújo Cardoso




Embora exercendo domínio quase absoluto quanto ao efetivo total do rebanho caprino, com 93,1% em 1999 e larga participação no rebanho ovino, registrando 50,9% neste ano-base, o sistema de criação predominante na região Nordeste para ambas as espécies ainda é o extensivo.



O desempenho produtivo se apresenta muito baixo, estando dependente, entre outros fatores, da vegetação natural e dos genótipos utilizados nesta atividade pecuária.



A produção de carne, leite e peles é seriamente prejudicada devido à ineficácia do rebanho criado no semi-árido, com a maioria dos animais sem raça definida, fruto de cruzamentos aleatórios, embora algumas raças exóticas estejam sendo introduzidas na região, portadoras de aptidões especiais.



As diretrizes da EMBRAPA-CNPC, segundo Madruga (1999, p. 6), preconizam que o sistema de produção no Nordeste Brasileiro prepondera uma; Exploração baseada em métodos tradicionais com baixo nível de tecnologia através do sistema extensivo sem suplementação alimentar, que quando realizada, o fazem esporadicamente no final do verão.



Empregado por pequenos proprietários rurais ( com ou sem título de terra), sem nenhuma mentalidade empresarial, sem recursos que permitam racionalizar a criação sem acesso ao crédito e, sobretudo, carecendo de orientação e informação técnicas, o que reduz suas possibilidades de aumentar a produtividade de sua criação. Este nível tem como característica uma oferta irregular de alimento ao rebanho, um controle sanitário deficiente, baixos índices de produtividade e elevada mortalidade.



Em suma, este nível tecnológico que caracteriza o criatório nordestino é um dos responsáveis pela inviabilização da caprinovinocultura regional, enfatizando-se que as referidas condições climáticas restringem consideravelmente a formação de um suporte forrageiro adequado às exigências locais, sobressaindo-se também a carência das condições de manejo e higiene, onde a inexistência de um processo reprodutivo eficiente, aliado à perda de rusticidade do rebanho por causa dos cruzamentos aleatórios peculiar ao próprio sistema extensivo ou ultra-extensivo, fazem com que o plantel da região não tenha uma definição precisa.



O estágio atual da caprinovinocultura nordestina ainda é marcado pela criação de subsistência, com pouco ou nenhum uso de práticas zootécnicas ou sanitárias. O resultado é a intensa exposição dos rebanhos à incidência de doenças parasitárias, definindo pouca expressão no rendimento do produto final.



Providências indispensáveis ao criatório são enfatizadas por Castro, A. (1984, p. 83), que as entende como medidas imprescindíveis a fim de se obter resultados positivos e rentáveis em quaisquer criações de gado, incluindo, entre estas, áreas de pastoreio e seu suporte, manejo, abrigos, pastagens, arraçoamento suplementar, água boa e limpa, sal à vontade, especialmente para os caprinos, alojamentos apropriados, cuidados higiênico-sanitários, assistência veterinária adequada e organização.



Esta definição se enquadra em nível tecnológico mais avançado, compreendendo uma;Exploração caracterizada pelo uso do sistema intensivo de criação, com razoável nível tecnológico, rebanhos com padrão racial definido, utilização do crédito bancário, com uma infra-estrutura de confinamento adequada, manejo de pastagem, controle alimentar, de enfermidade, e com baixo desperdício que permite tornar a atividade rentável. (Madruga, 1999, p. 6).



No entanto, a realidade se distancia do que preconiza o ponto de vista teórico. No Nordeste brasileiro, a caprinovinocultura ainda carece de melhor organização dos produtores e de uma política pública adequada à realidade regional, o que impede mudanças no nível tecnológico que caracteriza a macrorregião.



Exemplo de prescrições a respeito da atividade encontramos no Plano de Desenvolvimento Sustentável do Estado do Rio Grande do Norte, quando este prioriza o incentivo a caprinovinocultura, defendendo que; Por ser uma atividade que, diante das vicissitudes climáticas comuns ao semi-árido nordestino e, em especial, do Rio Grande do Norte, se apresenta comprovadamente adaptada, despontando significativamente dentro do escasso leque de atividades agropastoris para regiões secas. (IDEC, 1997, p. 111)



Este importante documento oficial sugere que a prática seja dinamizada e inserida nos parâmetros básicos de sua exploração, visto que esta atividade pecuária no Estado do Rio Grande do Norte segue a mesma tendência regional no que diz respeito à forma como se organiza sua cadeia produtiva.



Medidas simples como anotações referentes à evolução ou involução do tamanho do rebanho podem não estar sendo enfatizadas pelos produtores, o que em termos de organização pode representar maior controle e, consequentemente, definir formas de garantir melhor rentabilidade.



Nestes termos, não se pode esperar muito da caprinovinocultura na região Nordeste, exceto se houver condições favoráveis à mudança de nível tecnológico, que a curto e médio prazo representa um desafio.



Somente com a mudança de concepções, disponibilidade creditícia, efetiva política de valorização da prática pecuária, etc., é que se poderá articular racionalmente o sistema de produção e comercialização desta atividade rural.



As perspectivas futuras para a caprinovinocultura dependem de inúmeros fatores, tendo em vista que os números totais referentes aos rebanhos revelam-se favoráveis, levando em conta que a criação de animais rústicos se constitui em uma alternativa econômica para desenvolver o semi-árido (Mendes, 1986).



O apoio institucional é importante para o sucesso de qualquer empreendimento. A produção e comercialização de caprinos e ovinos exigem a organização dos pequenos produtores, pois o "calcanhar de Aquiles" ainda se encontra na fragmentação dos criadores, necessitando haver cooperativismo com condições favoráveis facilitadas pelas instituições competentes à reforma agrária.



A quase inexistência de locais especializados para o sacrifício dos animais, como abatedouros industriais, dificulta atingir-se padrões de qualidade. Principalmente a carne é comprometida com esta variável que poderia fazer a diferença quanto à plena aceitação do produto em mercados mais exigentes. A maioria dos abates não é feita obedecendo aos cuidados sanitários preconizados.



O produtor, em geral, negocia diretamente com atravessadores no próprio local em que realiza o criatório. Esta tendência define comportamentos da produção de carne e pele oriundas da caprinovinocultura. O leite, geralmente serve à própria subsistência do criador e sua família. Para se conseguir reversão no quadro apresentado pela prática pecuária na região Nordeste, deverá haver condições favoráveis à mudança no sistema de criação, para um mais indicado para a produção de reprodutores e matrizes (EMATER, 1987, p. 4), primando pelo melhoramento do manejo e alimentação, levando em conta a pressão sobre os recursos naturais, com ênfase à diversificação para cada rebanho, como por exemplo, o rebaixamento da caatinga, principalmente para os caprinos e o raleamento, mais indicado para a criação de ovinos (IBAMA, 1999, p. 17-18).



Outros requisitos necessários são a introdução de reprodutores selecionados, aumento das áreas de pastagens artificiais, com a introdução de forrageiras selecionadas e resistentes à seca, como a algarobeira, leucena, capim búfel, etc. (Mendes, 1987, p. 86-114), bem como o controle das principais doenças parasitárias e infecto-contagiosas (sobre estas consultar Castro, A. 1984; Vieira e Santos, 1967).



Quanto ao manejo sanitário, Mendes (2000, p. 28) destaca que a vermifugação e a higienização das instalações são os cuidados mais importantes que se devem ter, principalmente com relação aos ovinos, pois; As vermifugações nas condições do Semi-Árido nordestino devem ser feitas não somente quando aparecem os sintomas das verminoses, mas de modo a reduzir o prejuízo ocasionado pelo parasitismo subclínico. Recomendam-se quatro vermifugações anuais: a primeira no início da estação seca (junho ou julho), a segunda, 60 dias depois da primeira (agosto ou setembro), a terceira em novembro e a quarta e última vermifugação no início do período chuvoso.



Estas premissas básicas se revelam indispensáveis para que a caprinovinocultura seja incentivada na região, com condições de ter seu espaço garantido nos mercados interno e externo, embora saibamos que o Nordeste apresenta os menores índices de desenvolvimento humano no Brasil, revelando-se como desafio de grande proporção ao desenvolvimento sustentável.




REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:




CASTRO, Aristóbulo de. A cabra. 3 ed. Rio de Janeiro/RJ: Freitas Bastos, 1984.



EMATER/CE. Caprinovinocultura. Por Isaías Tertuliano de Figueiredo. 2 ed. Fortaleza/CE, 1987 (Informações Técnicas, 16).



IBAMA. Manejo florestal sustentado da caatinga. 2 ed. Brasília/DF: IBAMA, 1999.



IDEC. Plano de desenvolvimento sustentável do Rio Grande do Norte.Natal/RN: IDEC/SEPLAN, 1997.



MADRUGA, Marta Suely. Carne caprina: uma alternativa para o Nordeste. In: I Simpósio de produção animal do Nordeste. Recife/PE : SEBRAE-PE, agosto de 1999, 20 p. Disponível em :<>. Acesso em 14 de novembro de 2001.



MENDES, Benedito Vasconcelos. Alternativas tecnológicas para a agropecuária do semi-árido. 2 ed. São Paulo/SP: Nobel, 1986.



______. Raças de ovinos, caprinos e bovinos tropicais. Brasília/DF: ABEAS, 2000 (Coleção Mossoroense, Série "C", v. 1162)



VIEIRA, Geraldo Velloso Nunes; SANTOS, Virgínio Teixeira dos. Criação de ovinos e suas enfermidades. 3 ed. São Paulo/SP: Edições Melhoramentos, 1967.






(*) Professor-adjunto do departamento de Geografia da Faculdade de Filosofia e Ciências Sociais da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte. Mestre em Desenvolvimento e Meio Ambiente – PRODEMA – UERN.

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