Lei de Reforma ao Congresso Nacional: Breve Reflexão

Por Carlos Ramalho
Circula pela internet um e-mail intitulado “REFORMA DO CONGRESSO NACIONAL 2011” e dada a complexidade do mesmo, gostaria de discorrer acerca de algumas reflexões..

Embora o texto abaixo seja um pouco extenso, tenho certeza de que você será recompensado ao ler na integra.

Sem sombras de dúvidas a internet e as redes sociais se tornaram importante ferramenta de reivindicação e protestos frente a diversos assuntos polêmicos em nossa nação.
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Quando se trata de política, mais precisamente sobre a impunidade e as “falcatruas” dos políticos no exercício de seus mandatos ai é que a coisa fica feia, pois a revolta e indignação retratam de forma fidedigna, os contornos de descrença da população, não é mesmo?

Também pudera, pois a resposta do legislador na tomada de decisões para a promoção da melhoria de vida da sociedade é muito lenta frente às constantes e degradantes mudanças das relações sociais.
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Dentro do contexto acima, é salutar analisar a mensagem que vem sendo enviada por inúmeros internautas acerca de uma proposta de Emenda a Constituição intitulada “Lei de Reforma do Congresso de 2011”.
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Na mensagem o remetente solicita que a mesma seja reenviada para no mínimo 20 pessoas de forma a fazer com que o e-mail circule e alcance o maior número de brasileiros.
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Até ai tudo bem, e de fato é meritório perceber o engajamento das pessoas no tocante a expressar o desejo por mudanças estruturais para a política no Brasil, porém gostaria de compartilhar algumas considerações sobre alguns pontos contidos no referido e-mail para que possamos refletir:
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A mensagem faz menção acerca da aprovação da Lei da Ficha Limpa em tempo recorde, por exigência do povo, o que é verdade. Entretanto para que isto ocorresse foi necessária a coleta de assinaturas (não e-mails) para que a matéria fosse tramitada como Projeto de Iniciativa Popular na Câmara dos Deputados (consulta aqui a quantidade de assinaturas necessárias por estado)..

Veja o que diz a Lei 9.709/98 em seu Artigo 13 que versa sobre o tema acima:
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Art. 13. A iniciativa popular consiste na apresentação de projeto de lei à Câmara dos Deputados, subscrito por, no mínimo, um por cento do eleitorado nacional, distribuído pelo menos por cinco Estados, com não menos de três décimos por cento dos eleitores de cada um deles.
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§ 1o O projeto de lei de iniciativa popular deverá circunscrever-se a um só assunto.
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§ 2o O projeto de lei de iniciativa popular não poderá ser rejeitado por vício de forma, cabendo à Câmara dos Deputados, por seu órgão competente, providenciar a correção de eventuais impropriedades de técnica legislativa ou de redação..

O Projeto Ficha Limpa foi capitaneado por diversas instituições de renome nacional que integram o Movimento Combate a Corrupção Eleitoral – MCCE que fizeram com que a coleta de assinaturas fosse uma realidade. Neste contexto, desconheço informação de que alguma entidade tenha apadrinhado este tema (Reforma do Congresso Nacional) no tocante a fazê-lo tramitar como Projeto de Iniciativa Popular nos moldes da mensagem enviada.
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Apenas para informação, desde a promulgação da Constituição de 1988 apenas quatro Projetos tramitaram por Iniciativa Popular e foram transformados em Lei:
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2010 – Lei da Ficha Limpa
1999 – Lei Contra Compra de Votos
1995 – Lei do Fundo Nacional de Habitação de Interesse Social
1994 – Lei dos Crimes Hediondos
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Sobre os 7 (sete) requisitos presentes na desejada Emenda de Reforma do Congresso de 2011 (Emenda da Constituição do Brasil):
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“1. O congressista será assalariado somente durante o mandato. E não terá aposentadoria proveniente somente pelo mandato.”
De acordo com o dicionário “assalariado” quer dizer: “Individuo que trabalha por salário”.
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Não há duvidas que o salário de parlamentares foge a realidade de grande parcela da população, entretanto, enquanto os mesmos tiveram o poder de decidir sobre seus respectivos vencimentos será difícil mudar a situação. Veja o que diz o Item VII do Art. 49 da Constituição Federal, no que se refere a uma das competências do Congresso Nacional:
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VII - fixar idêntico subsídio para os Deputados Federais e os Senadores, observado o que dispõem os arts. 37, XI, 39, § 4º, 150, II, 153, III, e 153, § 2º, I;
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O artigo 37 menciona que a remuneração de Deputados e Senadores é vinculada a um percentual dos vencimentos dos Ministros do Supremo Federal, ou seja, para mudar salários de Deputados e Senadores e conseqüentemente de toda a esfera (Estaduais e Municipais), devido o efeito cascata deve-se levar em consideração rever os salários dos Integrantes do Supremo.
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Afinal quem definiria o salário dos mesmos? Com base em que? Isto a referida proposta não menciona.
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Quanto a questão da aposentadoria:
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A Lei 9.506/97 trata do assunto e cita em seu Artigo 2° a forma de aposentadoria:

.Art. 2º O Senador, Deputado Federal ou suplente que assim o requerer, no prazo de trinta dias do início do exercício do mandato, participará do Plano de Seguridade Social dos Congressistas, fazendo jus à aposentadoria:
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I - com proventos correspondentes à totalidade do valor obtido na forma do § 1º:
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a) por invalidez permanente, quando esta ocorrer durante o exercício do mandato e decorrer de acidente, moléstia profissional ou doença grave, contagiosa ou incurável, especificadas em lei;
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b) aos trinta e cinco anos de exercício de mandato e sessenta anos de idade;
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II - com proventos proporcionais, observado o disposto no § 2º, ao valor obtido na forma do § 1º:
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a) por invalidez permanente, nos casos não previstos na alínea a do inciso anterior, não podendo os proventos ser inferiores a vinte e seis por cento da remuneração fixada para os membros do Congresso Nacional;
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b) aos trinta e cinco anos de contribuição e sessenta anos de idade.

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§ 1º O valor dos proventos das aposentadorias previstas nos incisos I e II do caput será calculado tomando por base percentual da remuneração fixada para os membros do Congresso Nacional, idêntico ao adotado para cálculo dos benefícios dos servidores públicos civis federais de mesma remuneração.

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§ 2º O valor da aposentadoria prevista no inciso II do caput corresponderá a um trinta e cinco avos, por ano de exercício de mandato, do valor obtido na forma do § 1º.

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Percebe-se que existe uma Lei que normatiza a questão da aposentadoria dos Congressistas. Sendo assim, se o mesmo atender os critérios para tal poderá requerer o beneficio.

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Agora, só chega a 35 anos de mandato quem é eleito através do voto, ou seja, o povo vota.

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“2. O Congresso contribui para o INSS. Todo o fundo (passado, presente e futuro) atual no fundo de aposentadoria do Congresso passará para o regime do INSS imediatamente. O Congresso participa dos benefícios dentro do regime do INSS exatamente como todos outros brasileiros. O fundo de aposentadoria não pode ser usado para qualquer outra finalidade.”
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O Artigo 13° da Lei acima (9.506/97) diz:

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Art. 13. O Deputado Federal, Senador ou suplente em exercício de mandato que não estiver vinculado ao Plano instituído por esta Lei ou a outro regime de previdência participará, obrigatoriamente, do regime geral de previdência social a que se refere a Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991.

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Ou seja, o Congressista que não optar pelo Plano Oficial, obrigatoriamente deverá contribuir para o regime geral de previdência (INSS).

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Aqui cabe uma reflexão muito peculiar no tocante ao item 2.

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Acredito que quando se menciona transferir os benefícios para o INSS como fundo de aposentadoria, na verdade seria limitar o teto máximo a que o congressista faria jus quando da aposentadoria, assim como acontece no regime geral da previdência.

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Entendo que seria uma temeridade (além de ser Inconstitucional) o desejo de liquidar um Fundo de Participação de Previdência Privada, uma vez que, existe Legislação especifica que versa sobre o assunto. Ademais milhões de brasileiros fazem jus à Plano de Previdência Privada através de suas entidades de classe e/ou patronais. Veja o que diz o Artigo 202 da CF.

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Art. 202. O regime de previdência privada, de caráter complementar e organizado de forma autônoma em relação ao regime geral de previdência social, será facultativo, baseado na constituição de reservas que garantam o benefício contratado, e regulado por lei complementar. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998)

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“3. Congresso deve pagar para seu plano de aposentadoria, assim como todos os brasileiros.”
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Atualmente os parlamentares vinculados ao Plano de Seguridade Social dos Congressistas – PSSC contribuem de acordo com alíquota vigente para através de recolhimento descontados diretos na fonte. Veja o que diz o Artigo 12° da Lei 9.506/97.

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Art. 12. O Plano de Seguridade Social dos Congressistas será custeado com o produto de contribuições mensais:

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I - dos segurados, incidentes sobre a remuneração mensal fixada para os membros do Congresso Nacional e calculadas mediante aplicação de alíquota igual à exigida dos servidores públicos civis federais para o custeio de suas aposentadorias e pensões;

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II - da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, de valor idêntico à contribuição de cada segurado, fixada no inciso anterior;

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III - dos beneficiários das aposentadorias e pensões incidentes sobre o valor das mesmas que exceda o limite máximo estabelecido para os benefícios do regime geral de previdência social de que trata a Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, e calculadas mediante a aplicação da mesma alíquota a que se refere o inciso I.
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“4. Congresso deixa de votar seu próprio aumento de salário.”

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Absolutamente correto, pois isto é um escárnio diante da população. Pode até ser legal do ponto de vista da legislação, porém é imoral. É como legislar em causa própria. Para esta prática ser debelada é necessário que seja modificada a redação do Art. 49 da CF que autoriza a Câmara dos Deputados a deliberar e definir o valor dos vencimentos dos integrantes do congresso nacional. Quem sabe assim os políticos interesseiros e descompromissados dêem lugar aos vocacionados, não é mesmo?

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“5. Congresso perde seu seguro atual de saúde e participa do mesmo sistema de saúde como o povo brasileiro.”

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“Mesmo sistema de saúde como o povo brasileiro”? Acredito existir aqui uma dissonância no tocante a exposição da idéia.

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É sabido que grande parcela da população brasileira sequer tem acesso a saúde ou a faz através do Sistema único de Saúde – SUS. Porém outra grande parcela faz uso de benefícios de saúde através de planos oferecidos por suas entidades de classe e/ou patronais.

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Desta forma ao dizer que o congresso deve participar do mesmo sistema de saúde como o povo brasileiro subentende refletir em descontinuar histórico direito adquirido, neste caso, com plano de saúde privado. De certa forma isto só atenua o contraponto, pois tal abordagem alcançaria ou deveria alcançar todas as esferas e servidores do serviço público.

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Seria como dizer que a partir de determinada data toda a população brasileira só teria acesso a saúde através do SUS. Ou seja, o mesmo que descontinuar os planos privados de saúde de todos os brasileiros, o que também seria uma temeridade e afronta a Constituição, pois, isto acarretaria insegurança jurídica e um caos na economia.

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Corrobora para a afirmação acima o descrito no Artigo 199 da CF que diz:

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Art. 199. A assistência à saúde é livre à iniciativa privada.
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O requisito aqui posto nos leva a refletir também uma proposta no mesmo sentido que seria obrigar que filhos de congressistas só pudessem ser matriculados em escola pública, por exemplo. Porém tal possibilidade de emenda seria Inconstitucional, pois veja o que preconiza o item III do Artigo 206 da CF:

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Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:

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I - igualdade de condições para o acesso e permanência na escola;

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II - liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber;

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III - pluralismo de idéias e de concepções pedagógicas, e coexistência de instituições públicas e privadas de ensino;

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IV - gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais;
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“6. Congresso deve igualmente cumprir todas as leis que impõem o povo brasileiro.”

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Para este tópico não há outra reflexão senão a questão da impunidade. A distância que existe entre a sociedade e as esferas do Poder (Legislativo, Executivo e Judiciário) é tão somente a questão da máxima de que não há punição para crimes do colarinho branco.

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Veja o que diz o item I do Artigo 3° da Constituição Federal:

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Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:..


I - construir uma sociedade livre, justa e solidária;

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Como construir uma sociedade livre, justa e solidária diante do quadro social que se observa? A Lei deve valer para todos e da mesma forma no tocante a fazer valer o Artigo 5° da CF que diz:

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Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, (...):

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“7. Servir no Congresso é uma honra, não uma carreira. Parlamentares devem cumprir seus mandatos (não mais de 2), depois ir para casa e procurar emprego. Ex-congressista não pode ser um lobista.”

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Em maio de 2010 escrevi um artigo intitulado “A Democracia e a Farra de Mandatos Consecutivos” (click aqui para ler) cujo enfoque foi justamente este de gerar reflexão no tocante a mandatos consecutivos dos congressistas.

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Grande parte das casas legislativas brasileiras é integrada por políticos de carreira,ou seja, parlamentares detentores de 4, 5, 6 ou mais mandatos consecutivos. Não há duvida que isto é um prejuízo para a democracia e a sociedade, pois a situação atual demonstra a falta de interesse e ausência de bons projetos deste diversos ditos políticos.

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O § 5° do Art. 14 da CF permite que Vereadores, Deputados e Senadores (legislativo) concorram a infinitas eleições. O texto da Carta Magna fez menção restritiva apenas aos postulantes dos cargos do Executivo, conforme diz abaixo:

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§ 5º O Presidente da República, os Governadores de Estado e do Distrito Federal, os Prefeitos e quem os houver sucedido, ou substituído no curso dos mandatos poderão ser reeleitos para um único período subseqüente.(Redação dada pela Emenda Constitucional nº 16, de 1997)

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No que se refere a questão dos Lobistas deveria existir uma legislação mais restritiva para que gestores públicos pudessem atuar em atividades privadas no que se refere ao tempo de “quarentena” entre a transição do público para o privado.

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Dentro do contexto aqui abordado caberia ainda questionar a atual legislação eleitoral que permite, por exemplo, que vereadores disputem eleições em pleno exercício de mandato eletivo, sem necessidade de renuncia ou mesmo licença. E da mesma forma que Deputados disputem eleições para prefeito.

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Não sendo logrado êxito ao cargo disputado estes continuam como se no período em campanha tivessem trabalhado, permanecendo até o fim da legislatura em questão. Um absurdo tal permissibilidade eleitoral, além de ser totalmente incompatível com os anseios da sociedade.

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E o que falar do voto secreto? Dos suplentes de Senadores que assumem sem um voto sequer? Enfim... muitos são os itens polêmicos.

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A mensagem finaliza com os seguintes dizeres:

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“Se cada pessoa repassar esta mensagem para um mínimo de vinte pessoas, em três dias a maioria das pessoas no Brasil receberá esta mensagem. A hora para esta emenda na Constituição é AGORA.

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É ASSIM QUE VOCÊ PODE CONSERTAR O CONGRESSO. Se você concorda com o exposto, REPASSE. Se não, basta apagar. Você é um dos meus + 20. Por favor, mantenha esta mensagem CIRCULANDO”.

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Quero antes de finalizar, deixar registrado que compactuo com a urgente necessidade de mudança da legislação eleitoral e política brasileira. Entendo que a construção de novos pilares perfaz os anseios da sociedade que tem se mostrado cada vez mais atuante no tocante a exigir celeridade e transparência de gestores públicos.

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Devemos sim, enviar e-mails de protestos, entretanto, só e-mail não basta. Esperar que o Congresso Nacional promova mudanças que afetem diretamente a classe política é chover no molhado, como diz o ditado. Daí a necessidade de envolvimento para que Projetos de Iniciativa Popular viabilizem cada vez mais através do cidadão a efetiva promoção e consolidação das leis deste país.

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Vou ficando por aqui, porém sem não antes mencionar que respeito à pluralidade de opiniões acerca do tema. Espero que o debate reflexivo aqui proposto ganhe cada vez mais espaço no que tange a busca de um ponto de vista convergente de forma a contribuir para a construção de um novo pensar democrático.

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Agora que você já dispõe de mais esclarecimentos, poderá replicar este e-mail para seus conhecidos, toda vez que receber o e-mail intitulado “Reforma do Congresso Nacional 2011”.

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Forte abraço,

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Carlos Ramalho
www.carlosramalho.com.br
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Fontes Consultadas:
http://www.priberam.com
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9506.htm
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.ht

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