Xuxa desiste de lutar contra a história e a tecnologia

Demorou, hein? Depois de anos tentando fazer com que "Amor, Estranho Amor" evaporasse da internet e da memória das pessoas, Xuxa Meneghel se rendeu ao inevitável. Seus advogados declararam que "não há sentido em mover ação ou ações por causa do filme".

"Amor" foi dirigido em 1982 por Walter Hugo Khouri, um cineasta paulista que fazia uma espécie de pornô-cabeça. Seus filmes eram recheados de mulheres lindas e despidas, que emolduravam o vazio existencial do protagonista masculino.

O papel de Xuxa era pequeno. Ela fazia uma prostituta com quem um pré-adolescente tinha sua primeira experiência sexual. Ficava nua em cena com um garoto menor de idade, mas não muito mais do que disto.

"Amor, Estranho Amor" não foi um estouro de bilheteria. Pouco tempo depois, Xuxa estreou na TV e logo se tornou a Rainha dos Baixinhos. Em sua nova persona pública não havia espaço para o cinema erótico. Agora rica e poderosa, ela comprou os direitos de "Amor" e tirou o filme de circulação.

O caso ficou adormecido por muitos anos, até o advento da internet. A rede é amorfa, sem dono e incontrolável, e não demorou para que surgissem sites que disponibilizavam o filme todo para download. "Amor Estranho Amor" ganhou aura de fruto proibido: veja o filme que a Xuxa não quer que você veja!

A apresentadora começou então uma luta inglória, cujo mais recente capítulo aconteceu esta semana. Ela queria que o Google deixasse de apresentar resultados para quem procurasse por "Xuxa pedófila". O Superior Tribunal de Justiça decidiu o óbvio: ferramentas de busca não são responsáveis pelo conteúdo dos sites que indicam. Os advogados da moça já avisaram que irão recorrer.

Mas também esclareceram que "a ação contra o Google se restringe a apenas duas imagens", não contra o filme inteiro. E uma dessas imagens seria "fake": uma montagem do rosto da apresentadora numa situação que ela não teria vivido.

Xuxa e seus representantes legais parecem ter finalmente percebido que, em tempos de internet, é impossível apagar o passado. Que o diga Roberto Carlos, que impediu a venda de uma biografia sua, não-autorizada. Ou Daniela Ciccarelli, que tentou tirar o YouTube do ar, para ninguém ver suas estripulias numa praia espanhola. Tudo em vão: todos esses conteúdos estão a apenas alguns cliques de distância dos curiosos.

Meu conselho gratuito: deixa pra lá, Xuxa. Cada vez que surge uma notícia dessas, quase que dá para ouvir o barulho dos internautas vasculhando a rede atrás de cenas e imagens de "Amor, Estranho Amor". Um filme que estava praticamente esquecido volta a gerar manchetes. Gente que nem sabia da existência da obra agora corre atrás dela.

O fato é que Xuxa não tem nada do que se envergonhar. Não quebrou nenhuma lei, e os tempos eram outros. Melhor faria se assumisse o próprio currículo. "Fiz sim, e daí?". Além do mais, quem briga contra a história e a tecnologia, invariavelmente perde essa briga.



Tony Goes tem 51 anos. Nasceu no Rio de Janeiro mas vive em São Paulo desde pequeno. É publicitário em período integral e blogueiro, roteirista e colunista nas horas vagas. Escreveu para vários programas de TV e alguns longas-metragens, e assina a coluna "Pergunte ao Amigo Gay" na revista "Women's Health". Colaborador frequente da revista "Junior" e da Folha Ilustrada, foi um dos colunistas a comentar o "Big Brother 11" na Folha.com.


Fonte: Folha.com

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